sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

CONSULTORIA EM AD E O NOSSO PROTAGONISMO

Eu, como um profissional que realizei curso de aperfeiçoamento e formação em audiodescrição, bem como uma série de trabalhos como audiodescritor consultor, me sinto no direito de empreender um debate sobre o tema da consultoria. Ate porque, também realizo pesquisas e atuo como formador nesse campo. 
Em absoluto objetivo impor a minha opinião como a melhor ou única. Não pretendo pessoalizar a questão, pois creio que há espaço para diferentes tipos e modos de pensar sobre a AD, seja como produto cultural, como tradução visual, ou até ambos – o que é o meu caso. 
Meu objetivo aqui é refletir sobre a importância que considero fundamental e indispensável do audiodescritor consultor em uma equipe de audiodescritores. Mais que isso, de valorização dessa função muito além de simples concordância ou não com o produto já pronto.
Como todos já sabemos, no Brasil são mais de 35 milhões de pessoas com deficiência visual, dessas 500 mil são cegas, ou seja, as demais tem baixa visão, e enxergam usando algum recurso de acessibilidade, como é o meu caso, por exemplo.
É desconhecimento dizer que alguém com deficiência visual não possa ser roteirista, já que alguém com baixa visão pode sim fazer roteiros de imagens estáticas, por exemplo, e pude comprovar isso empiricamente.
Muitos de nós consultores temos formação na área de audiodescrição, em cursos ministrados inclusive por colegas que discordam dessa ideia.
Fato é que temos um certificado igual aos demais colegas audiodesritores que executam outraa funções. 
Dizem que a consultoria apenas avalia se os trabalhos estão bons ou não. O que é meia verdade, já que eu a Mariana Baierle e outros colegas participam dos processos da AD desde a pré-produção, provando, que tal é bem possível e eu diria necessário para a excelência da qualidade do trabalho.
O consultor é o que executa o controle de qualidade do produto, como dissera outrora: uma equipe que não conta ou usa mal seus audiodescritores consultores é uma equipe incompleta.
Uso o exemplo de uma indústria, onde sempre há aquele industriário que é responsável por aferir a qualidade do produto, pensar sobre ele e acompanhar o processo de produção desde o inicio para que a qualidade seja a melhor possível. Pois bem, na carteira de trabalho desse industriário não vai: consultor em indústrias, e sim, sua profissão é de industriário, como os seus demais colegas.
Outra questão é que, se muitas vezes os trabalhos requerem pouco tempo para produção,  eu e a Mariana já revisamos roteiros que foram produzidos, revisados, gravados e entregues em menos de 24 horas, assim, o tempo pode ser relativo. Afinal, se há uma demanda de trabalhos se contratam mais roteiristas, porque não contratar mais audiodescritores consultores para a equipe?
Outro argumento é importantíssimo, essa diferenciação feita ao consultor é um entrave político. Acho que é necessário pensar que as questões políticas também são fundamentais para a ampliação da AD, pois além de público queremos ser protagonistas nos processos de todas as esferas sociais, inclusive na audiodescrição. Cada vez mais as pessoas com deficiência fazem questão de participar de todos os processos que lhes envolvam e, principalmente, em igualdade de condições com todos.
Exemplificando o que eu digo
O audiodescritor consultor além de público da AD ele é um profissioal como outros na equipe, e assim deve ser tratado. Eu e a Mariana sempre fazemos questão de atuarmos desde ao inicio da produção dos trabalhos.
Tomo como exemplo a obra Colegas – O filme, (vencedor do prêmio de Melhor Filme do Festival de Gramado) que a Tagarellas fez a AD. Pois bem,  nosso processo de construção da AD foi o seguinte:
TODOS juntos assistimos ao filme, sendo que as roteiristas assistiram de olhos vendados. Depois debatemos sobre o que ouvimos do filme, pesquisamos sobre alguns temas e nos reunimos novamente para assistir a obra outra vez vendo as imagens. Conversamos novamente sobre o que seria interessante constar ou não no roteiro.
Em seguida, as roteiristas elaboraram o roteiro e nos repassaram para fazermos as observações que entendiamos necessárias. Antes de ler, assisti o filme outra vez, depois li o roteiro da AD inteiro.  Posteriormente a isso, comecei a ler o roteiro parte por parte assistindo a cada cena do filme de acordo com a parte apontada no roteiro. Fiz as observações que achei pertinentes sobre o roteiro e, antes de enviar para as roteiristas, eu revisei tudo novamente assistindo ao filme mnmais uma vez.
Enviei o roteiro para as roteiristas, que fizeram as adequações que entenderam pertinentes. Por fim, um dia antes da exibição do filme, já em Gramado, nos reunimos novamente e assistimos ao filme, ensaiando a narração da AD, e na medida em que tinhamos alguma dúvida, retomavamos, debatiamos e quando era o caso reformulavamos o trecho revisado. Assim, depois de algumas horas finalizamos o roteiro .
Isso sim é uma construção de AD em conjunto, e que qualifica o trabalho, sendo que os consultores tiveram papel fundamental no processo, de maneira equiparada aos demais membros da equipe. 
Esse protagonismo das pessoas com deficiência na AD é fundamental tanto para a qualidade quanto para a ampliação de público para a AD, já que é um fator que alimenta a identificação entre o público e o produto.

Um comentário:

  1. Bem esclarecedor, Felipe! Tanto para quem conhece AD, como para quem está començando a se familiarizar com o tema.

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