O Palau Guell fica no Bairro Raval, próximo à Rambla, e
talvez por isso tenha grande quantidade de possibilidades de transporte
público. Optei, como quase sempre, pelo metrô. A Linha 3 deixou-me a cerca de
uma quadra do destino, e embora não haja piso tátil, como a rambla tem amplo
espaço para passeio público a circulação não oferece grande risco, ainda que
aquele que for sozinho e tiver deficiência visual, tenha que – via de regra – pedir
auxílio para se localizar.
Fui até lá
com minha esposa Patrícia, que me informou ser muito pequena a sinalização que
demonstra onde está situado o lugar que procurávamos. De fato, caso não fosse
ela, eu nem teria visto que o endereço era aquele apontado. Da mesma forma não
há sinalizações para direcionar à bilheteria, o que dificulta bastante na
aquisição dos ingressos.
Um aspecto
interessante e que suscita certa reflexão. Existe preço do ingresso reduzido
para pessoas com deficiência, mas, apenas mediante uma determinada documentação
que apenas os cidadão que vivem na Catalunha podem ter, a chamada Tarjeta roja. Para ter esse cartão é
preciso ser residente na província por certo tempo, além de cumprir requisitos
que nenhum turista poderia ter.
Para mim,
pareceu um tanto estranho o fato de uma tarifa que objetiva ser inclusiva,
excluir os turistas com alguma deficiência; Considero que isso é uma
contradição dessa diretriz. Mas, eu deveria estar acostumado com isso, já que
muitas pessoas e instituições ainda tentam fazer inclusão baseada em ideias
segregacionistas e excludentes.
Retomando
ao relato da visita, após pagar o ingresso me dirigi até o guichê onde retirei
o audioguia. O interessante é que existem duas modalidades de recursos de
áudio. Há o audioguia tradicional, disponibilizado em dez idiomas, dentre eles
Português – de Portugal e não do Brasil, segundo a atendente. O segundo,
audioguia com audiodescrição, apresentado apenas em Espanhol – ou castellano
como os catalães preferem chamar.
Se for
solicitado, os atendentes mostram um mapa em auto relevo e braile. Este,
apresenta as quatro plantas da casa para que a pessoa possa se locomover, sendo
que a pessoa pode levar o referido mapa consigo na visita caso seja cego.
Melhor ainda, nesse material, está indicada a numeração de cada faixa do
audioguia com audiodescrição. Ou seja, a pessoa que quiser pode fazer a visita
com autonomia.
A casa da
família Guell arquitetada por Gaudi é uma verdadeira obra de arte, e mesmo que
o famoso artista catalão estivesse em início de carreira, demonstrava ser já um
expoente, dada a qualidade e criatividade do que criou. As diferentes curvas,
desenhos e texturas fazem do local um dos mais belos espaços artísticos de
Barcelona.
Fiquei
maravilhado com tamanha inventividade e beleza criada por Gaudi, que cuidou de
cada detalhe como se fosse uma pequena obra de arte. A suntuosidade do palácio
fez com que eu me sentisse vivendo e transpirando a atmosfera do final do
século XIX. Como eu soube de tudo isso? Simples, foi por conta da
audiodescrição.
Para
começar, o audioguia com audiodescrição desde o princípio da visita auxilia
muito ao situar o ouvinte onde ele está e para onde deve ir. Em cada faixa há
orientações de como e para onde a pessoa deve se locomover, informando sobre
obstáculos, escadas, rampas ou superfícies escorregadias. Isso é importante
para prover autonomia e segurança para aquele que está ouvindo, caso ele seja
cego ou tenha baixa visão.
Durante
toda a visita que leva um pouco mais de noventa minutos, o roteiro do audioguia
e principalmente da audiodescrição, privilegiam informações relevantes para a
compreensão e sensação do ouvinte com deficiência visual. Isso porque, são
feitas descrições conjugando detalhamento e objetividade. Muitas nuances ficam para
trás, mas nem mesmo aqueles que enxergam conseguem captar todos os detalhes em
condições semelhantes.
Embora eu
tenha sentido falta da descrição das cores de alguns objetos, vitrais ou salas
do palácio, creio que foi feita com clareza e qualidade. Algumas das formas e
texturas foram descritas realizando associações com coisas do cotidiano, como
as letras “U” e “L”, por exemplo.
A trilha sonora também é importante
nesse processo, já que as músicas de fundo enquanto está sendo feita a narração
ou para comelar e finalizar as faixas conferem sensações que ajudam a construir
as imagens daquilo que está sendo visitado. Isso porque, além da formação da
imagem acontecer pela audição, também pode ocorrer com o auxílio das memórias
de cada sujeito.
Ao mesmo tempo,
a narração também foi muito bem concebida, pois o texto do audioguia é narrado
por uma voz feminina, e o da audiodescrição, por uma voz masculina. Mais que
isso, a locução foi feita com entonações vocais diferentes, ressaltando
determinadas informações, colocando certa carga de emoções em outras, e tudo
isso sem uma interpretação demasiada.
Por todos
esses motivos, consegui compreender e formar imagens daquilo que estava exposto
e das ideias que estavam sendo apresentadas. Também tive as sensações de acolhimento
e entusiasmo com tamanhos detalhes e informações a que tive acesso, e que
certamente não as teria se não fosse a audiodescrição.
Portanto,
me senti muito satisfeito com essa visita por ter sido um dos museus com melhor
acessibilidade na cidade. A qualidade do material demonstra a preocupação e a
importância que os administradores dão às singularidades de seus usuários com
determinadas especificidades. Eis um exemplo a ser seguido por outros tantos
espaços culturais.