No dia 25 de Fevereiro de 2015 eu
realizava o sonho da minha vida até aquele momento e me tornava Doutor em
Educação. Naquele tempo em que eu era um menino que queria ser professor,
jamais imaginei que pudesse chegar até aqui diante das condições e circunstâncias
que a vida me apresentou.
O que ficou provado é que ainda
que eu seja uma exceção, um sujeito que nasce na periferia pode sim se tornar
um doutor, e que mesmo a educação brasileira sendo muito problemática para as
pessoas com deficiência, podemos ser protagonista no mundo e, principalmente,
de nós mesmos.
Serei sempre grato aos meus pais
pela educação, carinho e confiança que me deram, talvez seja o exemplo da
dedicação deles o que mais me impulsiona adiante. Na maioria das vezes eles
foram comigo o que eu quero que todos os pais sejam com seus filhos com deficiência,
que permitam que eles errem, deixem que eles quebrem a cara, e que aprendam por
si mesmos as delicias e as dores do mundo, que vejam primeiro a pessoa e só
depois a limitação corporal.
Estudei sempre em escolas
particulares que meu pai e minha mãe se desdobravam para pagar. No entanto, o
ensino não era nem próximo ao ideal, ainda mais para um adolescente com
deficiência, sem nenhuma adaptação era sempre um esforço dobrado. Até pouco tempo
ainda me sentia com déficit de conhecimentos tendo sempre que estudar mais do
que os outros para poder chegar perto de me equiparar aos demais.
Não conto isso para dizer que me
superei ou para aderir ao “coitadismo”, mas para demonstrar que o passado me
faz valorizar o presente, e o quanto eu sou grato pelas oportunidades que tive
e que aproveitei. Sou grato inclusive às chances que perdi, foram muitas delas
que me fizeram ir em frente e chegar onde estou.
Obrigado ao governo do estado do
Rio Grande do Sul por ter negado minha entrada como professor por ser pessoa
com deficiência. Foi a maior discriminação – institucional – que passei, e isso
me fez rever os rumos da minha vida e reencontrar minha vocação de buscar fazer
a minha parte na luta pelos direitos das pessoas com deficiência.
Seja como for, após tornar-me
mestre em 2010, fui aprovado para o doutorado e ingressei em 2011. Desde aquele
momento eu vivi intensas e inesquecíveis aventuras. Estava fazendo aquilo que
eu mais sonhava pesquisar, lecionar e atuar como ativista para um mundo mais
justo, fazendo – ou tentando – a minha parte para tornar o mundo um lugar menos
preconceituoso e que valorize mais as diferenças das pessoas.
Tive a oportunidade de viver em
Barcelona, que foi uma das grandes experiências pessoais e profissionais da
minha vida. Nunca me esquecerei de nenhum daqueles dias tão repletos de
aprendizados e de belezas sem fim. Conheci outros lugares e pessoas que muito
me acrescentaram, e nada pode ser tão mais especial do que isso.
Foram quatro anos de trabalho
intenso e dedicação completa à minha tese que se não é a melhor tese do mundo,
é a melhor que eu pude produzir. Ainda assim, sem modéstia, acho que ela tem
bastante qualidade e que agrega bastante ao debate sobre os modos de vida e
processos educacionais de pessoas cegas e com baixa visão.
Talvez porque, enquanto eu
escrevia a tese eu reescrevia minha própria história, na medida em que eu era
ao mesmo tempo objeto e pesquisador, fui escolhido pela pesquisa e não o
contrário, o que fez dela uma parte minha, que doei a outrem, afinal, agora a
tese é do mundo e já não pertence mais a mim.
Tenho muito orgulho do que
produzi no doutorado, dos textos que escrevi, dos que deixei de escrever, das
noites em claro preocupado com uma dificuldade na escrita ou nas ideias
embaralhadas ou escassas. Recordo com alegria dos nãos e= que disse aos amigos
que convidavam para a festa, sempre com a mesma fala: “preciso ajeitar a tese,
tenho que terminar uma coisinha aqui”. Escrevi e apaguei milhares de vezes até
encontrar a frase correta. Li muito, aprendi muito, tive mais dúvidas do que
certezas. E assim fui tecendo a tese até o fim.
Após a entrega do texto final da
tese vem a apreensão e o medo daquilo que poderia acontecer na defesa. Mesmo
sabendo ter uma boa tese as preocupações e a sensação de que algo vai dar
errado é mais forte do que o sentimento racional. As dúvidas e as incertezas
tomavam conta de mim e eu quis tanto que o dia chegasse logo.
Quando a banca começou e eu
declamei um poema, aquelas sensações ruins foram dissipadas. Fiquei concentrado
e tranquilo, tudo transcorreu melhor do que eu imaginava, com críticas
construtivas e elogios generosos comigo. Finalizei um ciclo de muitas alegrias,
diversas batalhas e muitas histórias para contar.
Foram tantas coisas que se
passaram nesse tempo que demoraria muito para contar todas as coisas que vivi e
que aprendi nesse tempo todo. Mas, preciso fazer agradecimentos especiais à
minha orientadora Lodenir karnopp, que tanto me ensinou a ser pesquisador e a
ser uma pessoa melhor.
Agradeço às pessoas que estiveram
na minha banca examinadora, professoras Maura Lopes e Rosa Hessel que estiveram
tanto na defesa de projeto quanto na defesa final. Grato também à professora
Eliana Franco, que esteve na defesa do projeto, e Lívia Motta que esteve na
defesa final. Aprendi muito com todas as contribuições de vocês, concordei e
acatei a maioria, discordei e debati algumas delas, mas certamente analisei com
carinho e atenção a cada uma delas.
Obrigado aos meus colegas de
grupo de orientação e de temática com os quais estudei e pesquisei por mito
tempo. Faço uma menção em nome de todos através da Janete Muller, amiga que
sempre foi parceira de trabalho e uma estimada amiga, e que mesmo depois da
minha saída da UFRGS e de seus inúmeros afazeres ainda mantemos contato,
afinal, amizades verdadeiras sobrevivem às distâncias e compromissos.
Agradeço também a minha amada
Fabiana, atualmente minha esposa, mas que na época estava comigo há pouco mais
de um mês, mas me transmitiu toda a confiança e a tranquilidade necessária para
que eu finalizasse a tese e a defesa da melhor maneira possível. É por viver
com ela diariamente que vejo minha tese viva em suas atitudes, nas lutas e nas
conquistas que obtemos. Foi ela que por essa época começou a me devolver o
prazer da literatura e de tantas outras maravilhas que a vida proporciona.
Por conta da tese e de meu desejo
de seguir pesquisando também tive a possibilidade de ser selecionado e estar
cursando meu pós-doutorado na ULBRA; Desde que conheci o programa de pós-graduação
em educação simpatizei com as pessoas, estive alinhado às temáticas, e tinha o
sentimento de que um dia eu seria parte daquela equipe, para minha sorte, esse
dia chegou e hoje posso dizer que me sinto muito feliz trabalhando na
instituição e com aquelas pessoas.
Sei que ainda tenho muito para
aprender como pesquisador, muito a evoluir em termos de currículo, sei onde
preciso melhorar e o que fazer para chegar aos patamares desejados. Segurei
como sempre, trabalhando com dedicação para qualificar cada dia mais,
batalhando e fazendo a minha parte para tornar o mundo mias justo, e não
deixando morrer a chama que acendeu em mim com a construção da tese, e que
levarei comigo para o resto dos meus dias. .