Há quem tenha um sonho e não corra atras dele. Há quem tenha um sonho e passe uma vida inteira perseguindo-o e não alcance. Outros ainda, o realizam apenas no fim da vida. Pois é, eu posso dizer que sou um sujeito de sorte, pois antes de chegar na metade da minha trajetória eu realizei um dos meus tantos sonhos,
Quando eu era adolescente a parte mais chata do fim de semana era ir ao cinema. Meus amigos gostavam disso, assistir aos lançamentos, aos filmes que todos falavam ou apenas para ter um pretexto e sair. Essas eram as ocasiões que mais me causavam tédio e sofrimento. Acho que até agora muito pouca gente sabe disso, mas eu sofria muito quanto tinha que ir ao cinema. Dizer que não entendeu o filme porque não enxergou nada, "fora de cogitação", então eu era obrigado a fingir que tinha entendido, fazer de conta que eu compreendera tudinho, a quem eu iludia?
Isso me causava uma profunda sensação de exclusão, me sentia como se o mundo estivesse virado de costas para mim, ainda mais que eu gosto muito da arte cinematográfica. Sofrer calado talvez doa mais do que contar a todos, mas fato é que sempre que o pessoal decidia ir, eu me divertia sempre antes e depois do filme, mas durante, era um imenso poço sem fundo em que eu caia.
Depois de meus vinte e poucos anos, me inseri na pesquisa sobre deficiência visual e passei a notar que eu deveria era mostrar que o cinema é uma arte que exclui, que nós não temos acesso e que algo deveria mudar para que eu e outras tantas pessoas tivessem a chance de ter acessibilidade. Minha mudança de postura e de encarar a deficiência de frente me deu força para tentar fazer com que nenhuma criança, jovem ou idoso com deficiência visual derramasse as mesmas lágrimas que eu diante daquela tristeza excludente, mas, por onde começar?
Sempre achei que um dia, quem sabe, acontecesse algo que não me deixasse mais sentir isso, alguma tecnologia, alguma forma difeente ou mesmo que um milagre ocorresse. Eu comecei a acreditar em milagres quando conheci a audiodescrição. Descobri que havia uma saida e que era sim possível se divertir e se emocionar no cinema.
Como todos sabem, a audiodescrição mudou a minha vida para melhor, já falei muito disso. mais ainda, me tornar audiodescritor é como fazer a minha parte ativamente para processar essas mudança e dar esse acesso que antes eu não tinha. Eu sou fascinado por essa função que exerço, eu sou até uma pessoa mil vezes melhor devido a audiodescrição. Mais ainda, trabalhar na Tagarellas é um presente que a vida me deu, pois além de colegas, eu ganhei amigos.
Mas o que eu gostaria de comentar aqui é que toda a tristeza que sentia outrora, pude transformar em alegria ontem na sessão com audiodescrição de Colegas - o Filme. Eu sonhava que isso um dia pudesse acontecer, ir assistir a um filme no fim de semana de estreia, com muitos amigos e ainda entender e me emocionar com tudo. Esse é o fabuloso milagre da audiodescrição.
A sala estava lotada com umas 200 pessoas, a maioria com alguma deficiência e usando os fones de ouvido através dos quais se podia ouvir a audiodescrição. Antes do filme, começamos a conversar com as pessoas e notar que elas estavam muito empolgadas e ansiosas antes da sessão, nesse caso sabiam que poderiam entender e se emocionar com tudo.
E foi o que aconteceu!! Embora eu conhecesse cada diálogo do Colegas, pois junto com a Mariana Baierle fiz a consultoria da AD, fui me sentar e aproveitar o filme. Perto de mim, alguns adolescentes com suas bengalas e fones de ouvido. Quando a projeção começou e aquela galera começou a vibrar com a AD, além daquela profunda alegria pelo dever cumprido, eu me lembrei do meu passado. Deixar as lágrimas correrem foi a única alternativa, pois eu percebi que milagres acontecem, sonhos se realizam e que aquele choro - o mesmo que está molhando o teclado agora enquanto escrevo - eram de uma doce sensação de redenção, de saber que daqui a um tempo ninguém mais vai passar por essas dificuldades e exclusões.
NUNCA em Porto Alegre houve tanta gente com deficiência desfrutando de AD. Além disso, tivemos a chance de contar com a presença do diretor de Colegas, Marcelo Galvão, do produtor Marçal Souza e dos queridos atores Ariel Goldenberg e Rita Pokk. Além de tudo, a audiodescrição se tornou um ponto de encontro para novos e antigos amigos com deficiência, que juntos se divertiram e se emocionaram tanto com o filme quanto com o papo com a equipe de Colegas. Muitos deles puderam perceber que ao contrário do que poderiam imaginar, sempre é possível chegar mais longe.
Mais que isso, ter audiodescrição num fim de semana de estreia é lindo, agora, numa sala comercial de um shopping muito conhecido da cidade é mesmo a realização de um sonho. A sessão não foi numa sala escondida, e sim no coração da cidade, para que todo mundo veja que a gente existe, que a AD existe, e que a gente vai ao shopping, basta ser acessível. Aqui devo mencionar o Shopping Bourbon, que nos cedeu o espaço e um grande apoio para a realização desse grande evento.
Iremos trabalhar com muito afinco e dedicação para que essa seja a primeira de tantas sessões com audiodescrição em salas comerciais. Cabe a cada um de nós cobrar para que mais ocasiões como essa aconteçam.
Tenho que mencionar quem tornou isso possível: Bourbon Shopping (e sua equipe competentissíma), Itaú Cinemas, Gatacine, Europa Filmes, Óptica Luis Henrique, Tesch Transporte Executivo, Dado Bier Bourbon Country, Fernando Waschburger, A2 Sistemas Audiovisuais, Guilherme Oliveira Silva, O Som da Luz, Acergs e Radioativa Produtora
Tenho que mencionar quem tornou isso possível: Bourbon Shopping (e sua equipe competentissíma), Itaú Cinemas, Gatacine, Europa Filmes, Óptica Luis Henrique, Tesch Transporte Executivo, Dado Bier Bourbon Country, Fernando Waschburger, A2 Sistemas Audiovisuais, Guilherme Oliveira Silva, O Som da Luz, Acergs e Radioativa Produtora
Por fim, gostaria de dizer que as vezes a gente acha que a revolução está muito longe do nosso alcance, ou que seja impossível de fazer algo. Mas, se a gente se der conta de que pequenos atos simples podem processar revoluções seculares, talvez note que a revolução está sendo feita. A audiodescrição é mais do que tradução visual, mais do que recurso de acessibilidade, ela é sim, o instrumento pelo qual fazemos essa revolução cujos resultados são os sorrisos e as lágrimas de quem pela primeira vez foi ao cinema e se emocionou com o que ouviu. Hei de estar firme e forte para ver que isso se tornará parte de nosso cotidiano!
Foto com parte do elenco do filme (Marcelo Galvão, Rita Pokk, Ariel Goldenberg e Marçal Souza), com o pessoal do Bourbon, com a turma da Tagarellas e com minha sempre amada esposa Pátrícia. (Não, não está na ordem da foto).
Foto com parte do elenco do filme (Marcelo Galvão, Rita Pokk, Ariel Goldenberg e Marçal Souza), com o pessoal do Bourbon, com a turma da Tagarellas e com minha sempre amada esposa Pátrícia. (Não, não está na ordem da foto).
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