quarta-feira, 29 de abril de 2015

O benefício da dúvida



Os gaúchos têm como uma de suas características culturais o fato de serem binaristas, ou se é Maragato ou chimango, gremista ou colorado, da direita ou da esquerda, e quem ousa não estar de nenhum dos lados, acaba mal visto por ambos. Pior do que viver em um lugar assim, é perceber que o mundo inteiro anda seguindo esses passos tão perigosos.
Cada vez mais é preciso ter opinião sobre tudo, não se tem mais o direito de não ter uma posição absoluta sobre determinados assuntos tidos como polêmicos. Mais ainda, as pessoas acreditam em tudo que leem nas redes sociais, firmam posições baseadas em notícias falsas, em meias verdades ou em algo que tem apenas a credibilidade dos “likes” recebidos.
Sempre fui um sujeito conhecido por ter opiniões claras – certas ou erradas, cabe a cada um julgar -, e de tanto opinar sobre tudo, meus amigos e conhecidos sempre querem saber o que penso sobre esse ou aquele tema. Muitas vezes essa curiosidade era para ver o “circo pegar fogo”, e foram várias as situações em que derrapei ao me posicionar sobre algo que eu deveria ter calado. Ou seja, falava demais, opinava demais, julgava demais e refletia de menos.
Com o tempo, e com o que as experiências me ensinaram aprendi que não preciso ter um lado sem ver o outro, e que é preciso pensar bastante sobre os diversos pontos de vista antes de formar uma ideia, e mesmo assim, sempre deixar um espaço para a mudança de opinião, se for o caso. Aprendi que às vezes é melhor a dúvida curiosa que a certeza sólida.
Percebo que as redes sociais são os terrenos mais férteis para esse “imperativo da opinião sobre tudo”, já que temos à nossa disposição as tribunas que antes não tínhamos chances de usar. Atualmente, podemos falar para o mundo inteiro, mesmo que ele não nos ouça e pouco se importe com o que digamos. Se antes era tão difícil expressar a própria opinião para que “todos” soubessem, hoje é fácil emitir uma posição sobre qualquer coisa, o complicado é que cada vez são mais rasas e efêmeras.
Ultimamente, os temas polêmicos inundam a web e as relações fora da rede, embora cada vez mais atuemos como se nela estivéssemos sempre. Ter uma opinião contrária a alguém é tê-lo quase que como um “inimigo mortal”, como se as pessoas de posturas diferentes não pudessem conviver com respeito umas pelas outras. Creio ser mais prudente discutir a ideia e não as pessoas que as proferem.
Tive diversas oportunidades em que discordei de muitas pessoas nesses casos polêmicos, inclusive de amigos próximos, e nem por isso os ofendi por pensarem de maneira antagônica da minha. Até porque, eu prefiro debater com alguém que não pense como eu, mas que seja inteligente e me traga algo de bom, do que alguém que pense como eu, porém, que não tenha a capacidade de me agregar conhecimento. Olha eu aqui sendo binarista, mas essa foi proposital para ver se o leitor estava atento.
O fato é que quanto mais o tempo passa, menos açodado sou em falar sobre minhas opiniões. Prefiro refletir bastante, ver o  desenrolar  dos fatos e até me informar muito mais sobre um tema, para depois explanar algo caso seja de fato necessário ou que eu tenha argumentos muito consistentes para fazê-lo. Já não tenho mais paciência ou vontade de me deter em certas discussões.
Nesse caso, acho que nos deve ser dado o benefício da dúvida ou de pelo menos calar quando achar conveniente, seja qual for o motivo. Há inúmeros temas que não tenho posição estabelecida, como ser a favor ou contra o aborto, por exemplo. Existem argumentos fortes de todos os lados e como não tenho conhecimento e nem refleti o suficiente, não sairei pelas redes sociais dizendo isso ou aquilo, usando mais de emoção do que de razão.
Assim, em tempos onde a gente é estimulado a falar sobre tudo, a se posicionar radicalmente sobre qualquer coisa, será que não valeria a pena refletir sobre o quão saturado isso tudo está ficando? Talvez o importante seja ter em conta que todos temos limitações, que não somos obrigados a ter certeza sobre tudo o tempo todo. Afinal, as duvidas e incertezas são os ventos que fazem girar os moinhos da nossa existência.

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