domingo, 15 de fevereiro de 2015

Sabado à noite

Sábado à noite.
Renascem os fantasmas.
E o ciúme fere como adaga afiada.
Sabendo estar em outros braços.
E mesmo dizendo querer estar a meu lado.
Insiste em dar a outrem teus abraços.

O ponteiro do relógio que passa arrastado.
É como espada lentamente me ferindo.
Cada segundo que vai passando,
aperta meu coração até o ver sangrando

No meu quarto escuro e triste.
Chego a ouvir as palavras que te dizem.
Que nunca serão tão amorosas como as minhas.
Posso até ver os beijos que concede,
a uma boca que repele,
e mesmo assim não o impede.

No domingo se prolonga.
Toda essa dor que me toma.
O sofrimento me consome.
Ja não tenho sede nem fome.
Sinto-me menor que um grão de areia.
Tenho inveja da alegria alheia.
E dos casais que podem,
se mostrar por inteiro.
Eles não têm maior amor que o meu.
Mas tem a todo tempo,
alguém para chamar de só seu.

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

moeda sem valor

a mesmice
se esmera
para me esmurrar
na masmorra da melancolia

uma morte em vida
uma azia fodida.
nem fada
nem foda
me faz feliz

Tristeza profunda
me afunda en copas
foram tantas fossas
me aprontando troças
já não sou nem mais traço
nem troco
de uma moeda sem valor

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

Eu não gosto de ir ao teatro



Teatro é uma arte antiga e repleta de elementos históricos e muito interessantes. Certamente que nossa sociedade evoluiu muito com o incremento reflexivo e contestador que as obras teatrais sempre apresentaram. Atualmente, dizer que se gosta de todas as formas de arte é cult, mesmo que talvez seja mentira. Como eu não sou adepto do politicamente correto e nem tenho paciência para essas convenções sociais, digo claramente: EU NÃO GOSTO DE IR AO TEATRO!
Essa minha falta de apreço pelo teatro tem um motivo muito claro, e provavelmente eu seja o menos culpado. Desde criança, fui algumas vezes assistir a peças teatrais, e enquanto eram com temáticas infantis eu entendia bem, mas à medida que o tempo foi passando e eu fui enxergando menos, ao mesmo tempo em que os espetáculos ficavam mais complexos, a dificuldade se tornou impossibilidade.
De certa forma,  desconheço o motivo que cativa as pessoas a gostarem de teatro, pois eu tinha que me esforçar muito para entender um pouco que fosse di que se passava. Cansei de tentar e larguei de mão o teatro, assim fui preferindo outros tipos de entretenimento, como TV, música e outros.
Isso aconteceu porque eu não compreendia quase nada do que  ocorria no palco, e comecei a achar que nunca iria conseguir sentir de verdade as emoções transmitida. De que me adiantava ir, pagar muito caro e não ter a chance de fruir como todo mundo por não ter acessibilidade? Assim, fui cada vez gostando menos do teatro, e seguirá até que me apresentem condições adequadas de participação, ou talvez nem isso, pois já terei perdido a pequena pontinha de apreço que ainda resta.
Sabemos que historicamente a acessibilidade nunca foi prioridade, embora tenha evoluído bastante. Também é fato que esse descaso não se restringe ao teatro. Na maioria dos casos, mais do que ignorância, os produtores de teatro viram-se de costas para o público com deficiência, crendo que a acessibilidade é um gasto e não um investimento e um grande e potencial público consumidor.  
Há várias questões que permeiam a falta de acessibilidade nos teatros e peças teatrais. Em primeiro lugar, não conheço uma casa de espetáculos com acessibilidade plena no Rio Grande do Sul. Todas as que dizem possuir acessibilidade, o fazem de maneira improvisada ou incompleta. Não há pisos táteis, sinalização bem feita, elevadores, rampas e outros recursos adequados em todos os ambientes, menos ainda quando se adentra à plateia.
Se eu nem consigo chegar com autonomia e segurança até minha poltrona, como posso gostar de ir a um lugar desses? Não há interesse em pensar sobre isso por parte dos administradores, que tem a desculpa na ponta da língua: “não há público suficiente para valer a pena uma reforma”. Essas pessoas se esquecem que há uma lei sobre acessibilidade arquitetônica e que lei não se relativiza, se cumpre.
No que diz respeito à produção e execução das peças de teatro as coisas não ficam menos difíceis. Parece não haver nem um pouco de boa vontade dos produtores em pensar seus produtos com audiodescrição, pois isso é entendido como um “gasto desnecessário”, e mais uma imposição do governo.
Tenho vários exemplos disso, um deles: foi aprovada no Conselho Estadual de Cultura uma resolução para promover acessibilidade nos produtos que tiverem financiamento público pelas leis de incentivo à cultura, mas por certas pressões, ainda não foi publicada no Diário Oficial do estado do Rio Grande do Sul. Soube até que alguns produtores culturais disseram que tal resolução inviabilizaria a cultura no RS, revoltando-se contra o direito à acessibilidade.
A cidade de Porto Alegre tem um grande festival de teatro que conta com financiamento basicamente por renúncia fiscal – logo, feito com dinheiro público -, e que não conta sequer com uma peça de teatro com audiodescrição. Embora eu enquanto contribuinte esteja financiando o projeto, e mesmo assim não posso ter acesso ao que eu ajudei a pagar, dado que seus realizadores entendem que audiodescrição é supérfluo.
Os produtores teatrais tem uma opção caso não desejem “gastar” com acessibilidade, que o façam sem financiamento publico e assim poderão dispor de suas obras como quiserem, caso contrario, que respeitem e contemplem aqueles que financiam seu trabalho. Preferiria que todos os produtores fizessem acessibilidade em suas peças por consciência e respeito ao publico, mas já que isso não é possível, que seja pelos rigores da lei.
O que sinto quando penso em ir ao teatro é que eu não sou bem-vindo, que estarei em um lugar onde quase todo mundo vai entender tudo e eu com muito esforço irei captar apenas uma pequena parte. Sei que se não houver audiodescrição eu ficarei me sentindo deslocado e provavelmente irei me chatear por ter menos acesso do que todo mundo, ainda que tenha os mesmos direitos. É uma pena que o meio cultural ainda veja a audiodescrição como uma “caridade” ou como “obrigatoriedade para financiamento governamental”.
Se fossem um pouco mais perspicazes, os produtores teatrais notariam que prover AD em seus trabalhos é mais do que um beneficio, e sim, uma possibilidade de ampliação de mercado consumidor. Não há mal algum em pensar desse modo, pois è isso que eu sou, um consumidor, e gosto de ser bem tratado e ter minhas necessidades contempladas. Aposto que teríamos bem mais pessoas nas salas de espetáculos do que temos atualmente.
Caso as peças de teatro tivessem audiodescrição, eu poderia começar a sentir todo o apreço que muita gente sente, e quiçá começasse a gostar dessa arte que para mim não tem a menor graça até o momento. Não enxergo os gestos, expressões faciais, figurinos, cenários e todos os outros estímulos visuais que essa arte proporciona, como gostar daquilo que não entendo?
Em São Paulo e no Rio de Janeiro, há ofertas de peças de teatro com audiodescrição quase todos os finais de semana, e será que precisarei me mudar para lá para gostar de ir ao teatro? Ou quem sabe poderíamos importar a consciência inclusiva que lá existe? Fico com a segunda opção, já que seria muito interessante se nossos produtores culturais deixassem de ser provincianos e pensassem na audiodescrição como um investimento e não como um gasto desnecessário.
 Se isso fosse feito, talvez eu não passasse a gostar de ir ao teatro, mas a “nova geração” de cegos e pessoas com baixa visão se acostumassem a frequentar teatros e passasse a existir ver um público consolidado que desfrutasse do prazer de assistir a uma boa peça.
Enfim, sinto-me livre para fazer esse sincero desabafo – embora tivesse bem mais a dizer sobre esse tema. Nunca fui uma pessoa intransigente, e se me provarem que eu estou errado ou proverem acessibilidade nos teatros, quem sabe eu venha a mudar de ideia. No momento, sigo com a opinião de que o teatro é uma forma de arte que pouco me acrescenta e que não tenho a menor vontade de dedicar meu tempo a assistir a um espetáculo desse tipo, seja ele qual for. A vida é uma recíproca, e o teatro – ao menos o do RS –, de modo geral, ainda não me ofereceu quase nada além de indiferença.