Há momentos na vida em que nos deparamos com aquelas pessoas
que tentam nos desqualificar intimidar ou oprimir. Dito tantas vezes e conforme
o contexto, acabamos por acreditar que tudo aquilo é verdade e aceitamos com
resignação a mais feroz e injusta das criticas. Isso ocorre com as pessoas com
deficiência, que taxadas cotidianamente como incapazes, acabam achando que o
são de fato.
O descrédito e a falta de confiança podem durar algum tempo,
mas não para sempre, pois quem tem talento para aquilo que faz não desaprende
nunca, por mais pedregoso que seja o caminho. Tenho conhecido alguns casos como
esses nos últimos tempos. Talvez porque aconteçam bem perto de mim, ou por ser
eu uma parte dessa história. Em tempos de mudanças, recomeçar é preciso, mudar
é essencial e recuperar a confiança é o que nos faz renascer.
Há uma tendência cultural da maioria das pessoas com deficiência
serem tratadas em uma relação de inferioridade, ou ao menos, de expectativas
tão baixas, que isso as acaba subjetivando e faz com que duvidem de suas
capacidades que estão ali guardadas dentro delas.
Tenho uma amiga que durante um tempo foi muito espezinhada,
oprimida e teve sua qualidade colocada em xeque. Infelizmente, a pressão foi
tanta que ela acreditou que de fato fosse desqualificada, preguiçosa ou
incompetente. Felizmente, mudanças vieram e novas chances apareceram, a
confiança foi sendo retomada e a minha amiga foi recuperando o brilho nos olhos
que todos nós admirávamos.
Essa semana, tive a chance de estar a seu lado em um curso
sobre audiodescrição. E, quando a vi exercendo o papel de consultora com uma
qualidade impressionante, dando dicas certeiras e indo direto ao ponto, eu
pensei: “é como o sol que ressurge por entre as nuvens!”. Parecia que fazia
suas observações instintivamente, como se fizesse consultoria de AD tão
comumente como respira.
Aquilo me emocionou muito, ver a minha amiga fazendo aquilo
que tanto gosta, e fazendo isso com confiança em si mesma e no seu talento.
Sim, ela está de volta! No momento, fiquei sem reação, a única coisa que eu
quis fazer foi ficar olhando aquela aula que um dia qualquer aspirante a
consultor deveria assistir.
Essas pequenas grandes coisas do cotidiano são importantes
para vermos coisas de formas diferentes daquelas que costumamos. Não dar
ouvidos a quem não merece e acreditar que um dia as coisas ruins ficam no
passado. E isso me fez refletir sobre um universo de coisas.
Lógico, também recordei das dificuldades pessoais da minha
amiga que hoje atingiu um patamar de maturidade e de sucesso que não deve mais
nada para ninguém, e melhor, ela mesma sabe disso. Acompanhei todo o processo
de perto e sei o quão difícil foi, mas aquela aula valeu por cada um dos dias
que eu tive que apoia-la.
Naquele instante senti como se um vistoso pássaro preso em
uma pequenina gaiola, tivesse ganhado a liberdade e começasse a voar pelo céu
como se jamais tivesse saído de lá. Há pessoas que descobrem que a chave que
abre a gaiola se chama confiança. Porque é ela que te faz sentir vivo e pleno
para aproveitar o que a vida tem a oferecer. É a confiança que nos devolve
desejos já esquecidos na memória, e nos faz ver quão colorida a vida pode ser.
A felicidade que podemos ter jamais dependerá do outro, ou
daquilo que ele possa vir a fazer ou a representar. Ela é intransferivelmente
nossa responsabilidade e, por isso mesmo, o maior compromisso que alguém pode
ter é consigo mesmo. Somos as escolhas que fazemos, e podemos nos resignar com
as posições que tentam nos impor ou romper com as amarras das convenções e
caminharmos com nossas próprias pernas.
O que importa é que a vida sempre nos dá uma segunda chance
de mudar o que não parece bem, e mais ainda, de usarmos essas oportunidades
como uma redenção diante do que nos fazia mal. A vida é um sopro, e quando a
gente menos espera o fôlego acaba. Por isso, enquanto o bafejar da existência
impulsionar nossos sonhos poderemos ir adiante, vencer a incredulidade – própria
e alheia -, rumo a mares nunca d’antes navegados....
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