Acho interessante quando a gente reivindica acessibilidade nos lugares e as pessoas dão respostas simplórias como: "não tem como" ou "tens que entender que tudo é um processo" ou pior ainda "estamos fazendo o possível". Seria bom ouvir isso se não estivesse sendo repetido a mais de uma década.
A feira do Livro de Porto Alegre é um exemplo disso, não o único e nem o pior de todos. Desde pequeno frequentava a feira, numa época em que de fato valia a pena ir e comprar livros mais baratos e com grande variedade. Hoje com o advento das grandes livrarias venderem a preços mais baratos via internet e por outros fatores, a feira é mais um evento turistico do que de fato um local para se comprar livros. É mais um símbolo cultural da cidade e que de fato concentra debates interessantes nos eventos paralelos do que os livros em sí.
É fato que as discussões sobre a temática da deficiência passaram a ter espaço, sendo possível encontrar um estande com audiolivros e uma que outra programação voltada a essa questão. mas será que é de migalhas que precisamos? será que: melhor isso do que nada? Que me disculpem aqueles que acham que sim, mas me nego a concordar com isso. Reconheço que os livros e debates sobre o assunto são qualificados - ainda que se possa contar nos dedos de uma das mãos. Mas, o espaço é completamente inacessível, então, como ir até esses eventos?
É muito representativo o fato de se colocar a parte da "inclusão" na área infantil, num espaço minusculo e sem visibilidade, será que a postura de incluir pondo lá num canto que ninguém usa é mesmo uma inclusão de fato? E que não me venham dizer que não há espaço na praça pois, existem muitos estandes comerciais na parte central, e por mais que eles tenham pago por isso, acho que devemos lembrar que a feira é financiada em sua maior parte por incentivo fiscal e por recursos públicos, inclusive com a grana das pessoas com deficiência que pagam impostos como as demais.
Digo isso, porque fui à feira do livro no domingo, e como de costume, tive problemas em meu acesso aos livros e na circulação pelo espaço, já que existem muitos cabos segurando as tendas, as informações estão em letra grande, mas a uma altura impossível de enxergar. Nos balcões de informações cada funcionário dizia uma coisa e eu rodava como um pião em busca do lugar que eu procurava. Não há material em fontes ampliadas - em braile eu nem perguntei.
Os frequentadores também tem sua parcela de culpa, pois vendo que haviam pessoas usando bengala e outra com baixa visão, não saiam do caminho, parecia que tinham atração magnetica pela bengala da amiga que estava comigo.
Mesmo assim, o piso é irregular, não há piso tátil no local, e ainda que se diga que é um local histórico, eu perguntaria: será que a gente não tem direito á acessibilidade em locais históricos? Ainda que aceitando esse argumento, porque não existem guias preparados para as pessoas com deficiência visual ou pessoas com mobilidade reduzida ou outra necessidade específica?
Acho que sou diferente da maioria das pessoas, talvvez porque eu viva nessa condição - que muito me orgulha - de pessoa com deficiência, mas não acho que acessibilidade seja um assunto a ser deixado para depois, ou que já que sempre foi assim, continuará sendo tudo inacessível ad eternum. Não é uma questão superflua ou um capricho, nem mesmo uma bondade, é um DIREITO CONSTITUCIONAL.
Muita gente ainda acha que tornar um ambiente acessível está sempre em segundo plano - não que esse seja o caso da feira do livro - e esquecem que nós somos consumidores, pessoas que tem direito a frerquentar com segurança e autonomia os ambientes culturais da cidade. Porque as pessoas se preocupam em plantar uma folhagem na Praça da Alfandega mais do que em colocar ali um piso tátil?
Enfim, eu teria muito a dizer sobre o assunto, e se o leitor acha que eu estou sendo acido em demasia, experimente bater com a testa em um daqueles cabos de aço para ver que a dor que eu sinto também é física.
Mas o que de fato me incomoda é que ao mesmo tempo em que se diz que a acessibilidade é prioridade, na prática ela é a prioridade menos prioritária de todas, e os espaços que nos são dados ainda são lá num cantinho. Sei que a caminhada é longa e que tudo é um processo, mas pergunta pra minha testa com um baita galo se ela entende isso...